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quarta-feira, 3 de março de 2010

COLUNISTA - Elza de Mello


Nuances de Vidas em Crônicas (30)

Pouco passava das sete horas da manhã quando cheguei à Clínica Vitali, na Rua Vitória. As casas com as janelas cerradas mostravam que a população ainda dormia. Um ou outro trabalhador passava à pé ou de bicicleta para o trabalho, junto com estudantes que já tomavam o caminho da escola.
A manhã plena de sol anunciava um dia morno, com uma agradável temperatura. Recordações passaram pelos meus pensamentos enquanto esperava pelo atendimento.
A casa onde morou seu Ângelo Lodetti e a família, fechada naquela hora da manhã parecia me dizer que em breve estaria aberta para o movimento normal do dia. Dona Santina assomaria à porta para pôr em dia a rotina, abrindo as janelas de par em par, acendendo o fogão com a lenha seca para não espalhar fumaça na parede branca da cozinha. Depois ela seguiria até a horta para dar tratamento especial às hortaliças, sobretudo às alfaces que precisavam sempre de um jato d’água para estarem fresquinhas na hora do almoço. Para dona Santina, a sua horta tinha um sentido especial: a sua ligação com a lavoura, amor que herdou da mãe e que continuava repassando para a família em forma de uma alimentação saudável.
Ao marido cabia a política, a administração do recém emancipado município. Ela, a primeira dama estava a cuidar de uma grande e laboriosa família. Também não era uma mulher afeita às vaidades de idas e vindas ao salão de beleza, aos jantares e festas sociais. As festas religiosas e as comemorações de família é que tinha um real sentido em sua vida. As crianças estavam todas crescidas, mas havia os netos, belas crianças que enchiam a cozinha de apetite e de alegria. A família, sim, ela era o elo maior da maternidade e da essência da posição de esposa e mãe. A casa fechada em plena manhã ensolarada parecia esperar pelas mãos adormecidas de dona San-tina. Mas outros continuariam a jornada do dia, com certeza.
A rua está diferente, é verdade. Aqui e ali há outras casas, inclusive o edifício onde espero atendimento parece ocupar um espaço sagrado de minhas recordações. A casa de seu Pedro Silva onde tantas vezes eu o vi em cuidados com a bela horta, está ocupada por uma escola de idioma estrangeiro. Os canteiros deram lugar a uma ampliação da casa. Foi necessário um espaço maior para abrigar as salas de aula. Horta e jardim é um espaço de cuidados indispensável para uma escola. Ao lado há uma lanchonete em uma arquitetura rústica, servindo lanches rápidos, tudo muito diferente da polenta que tantas vezes encheu a rua de aroma e apetite. Tempo em que repetíamos o refrão. ‘Meio dia, panela no fogo e barriga vazia’. E as palavras pareciam aumentar ainda mais o nosso apetite de infante-juvenil.
Na casa que fora do seu Adilson, uma saudade peculiar me despertou. Ali as saudades eram de um tempo mais além, um tempo de juventude aflorada e de jornada de trabalho. Estava impregnada do sorriso das meninas e os cuidados de dona Maria. Os crochês mimosos por todo espaço, inclusive na bandeja em que servia o cafezinho; um marco da vida profissional da filha Maria Cacilda e minha. Éramos colegas de trabalho, colegas de labuta, mas também de sonhos de quem vive a realidade da educação e a utopia que a vida profissional nos aponta.
Rua Vitória! Num espaço de tantas recordações, não pude deixar de pensar no seu Manoel Goulart. Ele tão presente na Rua Vitória nas primeiras horas da manhã.
E por aí vai as minhas recordações.

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