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terça-feira, 4 de agosto de 2009

COLUNISTA - Walterney RÉUS: Envelhecer ou ver o sol se pôr

Estava eu ouvindo uma das minhas tantas miscelâneas musicais quando começou um lote de músicas do ABBA. Ah!!! O ABBA, aquele quarteto sueco que não tinha poderes mas era fantástico. I have a Dream, Ring-Ring, Take a chance on me, The winner takes it all e mais uma fieira de músicas que embalaram adolescentes e continuaram a embalá-los enquanto iam entrando para a vida adulta. Não vou entrar no mérito da substância das letras, ou se a harmonia era rica (para mim é, porque estimula meus sentidos), mas sim num outro raciocínio que me ocorreu. Até aqui, nestes 44 anos, cada fase de minha vida teve seu tempo de maturação e a pude degustar. Tive oportunidade de ver a semente abrir espaço terra afora, o broto virar muda, a muda virar árvore, a árvore dar frutos e, finalmente, saboreei os frutos.

Sempre que tentei antecipar o ciclo querendo devorar a fruta antes de seu tempo, tive o desprazer de fazer uma careta pelo amargor do fruto tirado do pé antes de estar pronto. Do mesmo modo, sempre que esperei sovinamente para acumular frutos, os vi cair do pé, apodrecidos. Com 44 anos definitivamente não sou um homem velho, principalmente para os padrões atuais. Mas, já tenho tempo de vida suficiente para apurar a sensibilidade de respeitar o ciclo das coisas (a despeito de continuar errando... porque, confesso, leitora e leitor, essa sensibilidade é coisinha difícil de apurar).

Mas, para costurar a abertura do texto com o raciocínio que ela me remeteu, digo que pelas razões que todos nós já estamos carecas de saber (quer dizer, nem todos, eu tenho muito cabelo... rs) o mundo involuiu, isso mesmo, involuiu no aspecto paciência e respeito aos ciclos. A voracidade com que queremos saborear as coisas, os sentidos, a vida, nos leva ao chamado efeito rebote, que é o de não sentir por querer muito sentir; de não ter prazer, por querer todo o prazer; de amargurar por querer toda alegria. Nada temos por tudo querermos.

E isso fica claro quando o frango que vai à mesa tem 45 dias de existência; quando a horta desapareceu do nosso modo de vida, quando a TV nos oferece 150 canais e, por isso mesmo, não paramos em nenhum, quando os arranjos musicais nem chegam a virar tendência, porque o mundo é pop e o pop é fugaz.

Enquanto o ABBA era uma trilha musical para muitos de nossos sonhos, começando por um ritual de aproximação, até o êxtase do encontro numa pista de dança, seguindo pela interminável conversa antes-durante-e-após rostos e beijos, embalando passo-a-passo o caminho de casa, quando entregávamos o amor à porta e partíamos para a nossa cama para ouvir mais um pouco da mesma música, os tempos atuais não nos dão trilha alguma.

Não estou simplificando meu raciocínio num saudosismo piegas, mas sim, refletindo sobre a sofreguidão de agora. Não há música, porque não há mais tempo para compor. Não há amor porque não há mais tempo para arar o coração para árvore tão exigente.

O mundo involuiu porque confundimos agilidade com insensibilidade. Caminhamos sem fôlego, sem olhar para os lados, sem apreciar paisagem. O lance é chegar rápido. Não se valoriza nem a estrada, a viagem, tampouco o ato de chegar. Porque chegar significa alcançar o ápice do prazer... pelo menos presumo isso. Parece até a metáfora dos dois alpinistas que subiram rapidamente a montanha e, quando chegaram ao pico, resfolegantes, azuis de frio, rapidamente fincaram uma bandeira para dizer que estiveram ali e desceram, rolando montanha abaixo. Lá embaixo perguntaram... e o céu, de lá de cima, como era? Eles responderam: Não vimos o céu... estávamos sem ar, sem tempo e sem prazer pra isso.

Isso me lembra uma piada: Dois touros estavam no topo de uma colina. Lá embaixo, as vacas pastavam. O touro jovem, peito estufado, disse: Vou descer correndo a colina e “cobrir” uma daquelas vacas. Ao que o touro mais velho disse: Pois eu vou descer andando a colina e “cobrir” todas as vacas.

Essa é a diferença entre envelhecer e ver o sol se pôr.

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