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quarta-feira, 21 de setembro de 2011

Colunista Elza de MELLO

Aquém dos trilhos Vidas em Crônicas (27)

Os ipês exibem a florada em nuvens rósea ou áurea, e percebemos que estamos vivendo à entrada da primavera. O mundo parece rejuvenescido depois da dormência dos dias de inverno. Parece que estamos em um novo ciclo de vida e isso me faz lembrar pensamentos filosóficos sobre o tempo e as diversas formas de medi-lo com precisão. E entre os diversos pensamentos sobre a medida do tempo, fico com Mário Quintana que conta o tempo em poesias ao afirmar: se me fosse dado, um dia, outra oportunidade, eu nem olhava o relógio/seguiria sempre em frente e iria jogando pelo caminho, a casca dourada e inútil das horas.
Sem dúvida, a mais bela das revelações para um homem no alto dos seus oitenta anos de vida. Sobretudo a revelação de quem viveu há meio século de distância de minha geração. Atualmente, poucos veem o tempo por um viés poético como Quintana. Vivemos imerso num capitalismo ferrenho, fortalecidos na ideologia de que o tempo é dinheiro. E como o tempo precisa render em dinheiro, e dinheiro se transforma cada vez mais em capital, há quem afirme que o tempo é um velho, cada vez mais velho a quem se acumula os a-nos que passam de quem a vida foge.
A vida é contada apenas na frugalidade das horas e na rentabilidade do capital.
Há uma obsessão de produtividade e os segundos são cobrados ao pé da letra. O relógio dita o sentido da vida do homem. Conta-se o tempo pela realização do trabalho do homem na jornada diária, semanal, no sucesso da meta, e pela vida profissional. Não há mais que o compromisso do carpe diem. Esse é o homem dos dias atuais, o homem plasmado no capital das forças produtivas. Outra mudança perceptível na contagem do tempo é em relação ao nosso eu interior. Basta olharmos o livro bíblico Cântico dos Cânticos para percebermos a mudança de ideologia. Lá os versos bíblicos marcam o tempo amoroso com os frutos maduros que pendiam das árvores, prontos para ser degustado.
A vida é mostrada com sabor, sem pressa pelo temor de que o fruto apodreça ou algum mal a danifique. O tempo amoroso é a promessa divina colocada ao homem como missão de povoar a terra. Por outro viés, o tempo crono-lógico está presente na poesia dos Cânticos dos Cânticos ao mencionar as folhas dos plátanos amarelas, demarcando a chegada do outono como uma fase da vida humana. Em toda a observação há uma poesia infinita. A folha madura ou caída pela ação da nova fase de vida, reveste-se de uma beleza peculiar demonstrando que o tempo de vida tem inícios e fins. Aí é possível perceber o pensamento de Heródoto: tempo é criança brincando, jogando. Ele antevê esse movimento circular da vida, possibilidade de novo começo.
É verdade... hoje nascemos e morremos pelo relógio. Mas não faz tanto tempo que os nossos avós olhavam o sol e sabiam com precisão o tempo para dar continuidade aos trabalhos e compromissos sem saber as horas, pois, só a noite separava os dias. Era um tempo que se vivia mais o compromisso do ser e não o do ter; mas foi esse, com certeza, o tempo mais fértil na formação de nossa gente içarense, e no desenvolvimento de nossa terra. Oxalá possamos, deixar para as novas gerações, a semente gera-dora dos bens fraternos que tivemos. Que o tempo possa ser contado, aos que vierem, entre o ser e o ter e não apenas no ter um salário melhor, o carro do ano, uma casa decorada com a nova tendência, a roupa de marca, os últimos modelos de eletrodomésticos... entre outros sonhos de consumo. Que o tempo possa ser contado também como presença de paz, união e fraternidade no espaço de vida e vivência. Que a vida possa ser contada e cantada como uma saga valorosa pela Nossa Terra e Nossa Gente e não apenas datada e contabilizada.

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